Polêmica à venda
Por Tulio Brandão
Muito já se falou do caso Julian
x Medina. Nos sites gringos, uma salada bem diversa de opiniões de autores e
leitores, com seus comentários sem filtro, quase sempre criticando o resultado
e condenando a reação do brasileiro no pódio.
Até Kelly Slater andou dando seus
pitacos na mesma linha: admitiu ter havido falha de julgamento, mas criticou o
comportamento de Gabriel no pódio e de sua família na área reservada do evento.
Justamente ele, que é sabidamente um mau perdedor. Exatamente por isso, ganha sempre.
Engraçado ver opiniões tão
elegantes brotarem de um esporte com histórico tão tribal. Desconfio que os
críticos da conduta de Medina tenham se calado quando Makua Rothman desferiu um
tapa na cara de Paulo Moura e Sunny Garcia perseguiu Neco como um animal nas
areias de Pipeline, no Havaí.
Mas aposto que gritaram,
revoltados, quando souberam que Rabbit Bartholomew perdera alguns dentes por
ter escrito o excelente “Bustin Down the Door”.
Para todos os povos, sem excluir
o nosso, selvagens são os outros.
No meio dessa babel, por
indicação do blog do Júnior Faria, atentei para um texto publicado no site The
Inertia, do jornalista nipo-americano Tetsuhiko Endo, sobre a importância da
tal “perda de espírito esportivo” de Medina.
Diz o texto, que defende a reação
de Medina: “O surfe tem essa estranha
cultura de “calar a boca e sorrir,
que tudo vai ficar bem”, que vai completamente contra os paradigmas do esporte
em que você é instigado a lutar como um lobo raivoso até que a vitória seja
sua.”
Entre os inúmeros comentários na
minha última coluna, alguns, que falavam sobre a figura do head judge, me
chamaram a atenção. Um leitor amigo e antigo juiz da ISA mandou por e-mail boa
analogia, em tempos de mensalão, com o presidente do STF. A diferença está na
transparência: na ASP, não conhecemos o voto de quem define a escala de notas
dos juízes.
Mauro Cid, que comentou na última
coluna, foi mais direto: “A figura do head judge na ASP é uma total aberração.
Vai contra qualquer índice de credibilidade. Saibam que no final das contas,
este se torna o principal e único juiz que determina o resultado de uma
bateria. E ai do juiz que não seguir suas orientações.”
A saber, o head judge da final em
Portugal era o australiano Richie Porta, um dos únicos na ASP a manter, mesmo
nos bastidores, a opinião de que Julian venceu a disputa. Isso não é suficiente
para fazer juízo de valor sobre Porta. O que os amigos que na ASP dizem é que
os juízes, hoje, tem um recorte muito parecido de opinião, e raramente
discordam entre si.
Durante a semana, circularam
rumores de que vários membros da entidade, inclusive juízes, tinham percebido o
erro ao analisar mais cuidadosamente o vídeo das ondas.
A câmera utilizada pelos juízes é
a mesma que a do público, mas fica em apenas um ângulo, para facilitar o
julgamento. Parece que o ângulo escolhido em Portugal era semelhante ao do
palanque, de onde, sustentam alguns membros da entidade, a vitória parecia ser
de Julian.
Parece óbvio que, em casos difíceis
como os de Julian x Medina e Owen x Mineiro, os juízes devem pedir o auxílio de
todos os ângulos possíveis para finalizar o julgamento. Boa dica. Outra medida
importante seria dar transparência aos atos de head judge. Os juízes não podem
ser os únicos a ficar na reta das críticas.
De toda a repercussão do caso, me
chamou especialmente a atenção a popularidade atingida pela polêmica. A coluna
escrita na semana passada bateu mais de 1,1 mil likes no Facebook, assim como
outros textos explodiram a audiência de vários sites.
A despeito da campanha pelo
boicote brasileiro a eventos, que andou circulando pelos fóruns de sites de
surf, o erro de julgamento pinta como uma salvação para os bolsos da ASP.
Agora, temos o drama, com bandidos, mocinhos e muita polêmica.
Não me espantarei se me disserem
que o número de acessos da próxima etapa do WCT, em Santa Cruz, nos EUA, foi
multiplicado em relação a Portugal.
O sistema tem a fórmula mágica
para transformar limões em limonada. Transformou o movimento punk, que o
contestava de modo visceral, em moda. E, absurdo ou não, o mesmo parece que irá
acontecer agora: de um erro grosseiro, sairá o maior pico de audiência no ano e
o provável início de uma rivalidade histórica e campeã de audiência.
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