domingo, 28 de outubro de 2012

Polêmica à venda



Polêmica à venda
Por Tulio Brandão

Muito já se falou do caso Julian x Medina. Nos sites gringos, uma salada bem diversa de opiniões de autores e leitores, com seus comentários sem filtro, quase sempre criticando o resultado e condenando a reação do brasileiro no pódio.
Até Kelly Slater andou dando seus pitacos na mesma linha: admitiu ter havido falha de julgamento, mas criticou o comportamento de Gabriel no pódio e de sua família na área reservada do evento. Justamente ele, que é sabidamente um mau perdedor. Exatamente por isso, ganha sempre.  
Engraçado ver opiniões tão elegantes brotarem de um esporte com histórico tão tribal. Desconfio que os críticos da conduta de Medina tenham se calado quando Makua Rothman desferiu um tapa na cara de Paulo Moura e Sunny Garcia perseguiu Neco como um animal nas areias de Pipeline, no Havaí.
Mas aposto que gritaram, revoltados, quando souberam que Rabbit Bartholomew perdera alguns dentes por ter escrito o excelente “Bustin Down the Door”.
Para todos os povos, sem excluir o nosso, selvagens são os outros.
No meio dessa babel, por indicação do blog do Júnior Faria, atentei para um texto publicado no site The Inertia, do jornalista nipo-americano Tetsuhiko Endo, sobre a importância da tal “perda de espírito esportivo” de Medina.
Diz o texto, que defende a reação de Medina: “O surfe tem essa estranha cultura de “calar a boca e sorrir, que tudo vai ficar bem”, que vai completamente contra os paradigmas do esporte em que você é instigado a lutar como um lobo raivoso até que a vitória seja sua.”
Entre os inúmeros comentários na minha última coluna, alguns, que falavam sobre a figura do head judge, me chamaram a atenção. Um leitor amigo e antigo juiz da ISA mandou por e-mail boa analogia, em tempos de mensalão, com o presidente do STF. A diferença está na transparência: na ASP, não conhecemos o voto de quem define a escala de notas dos juízes.
Mauro Cid, que comentou na última coluna, foi mais direto: “A figura do head judge na ASP é uma total aberração. Vai contra qualquer índice de credibilidade. Saibam que no final das contas, este se torna o principal e único juiz que determina o resultado de uma bateria. E ai do juiz que não seguir suas orientações.”
A saber, o head judge da final em Portugal era o australiano Richie Porta, um dos únicos na ASP a manter, mesmo nos bastidores, a opinião de que Julian venceu a disputa. Isso não é suficiente para fazer juízo de valor sobre Porta. O que os amigos que na ASP dizem é que os juízes, hoje, tem um recorte muito parecido de opinião, e raramente discordam entre si.
Durante a semana, circularam rumores de que vários membros da entidade, inclusive juízes, tinham percebido o erro ao analisar mais cuidadosamente o vídeo das ondas.
A câmera utilizada pelos juízes é a mesma que a do público, mas fica em apenas um ângulo, para facilitar o julgamento. Parece que o ângulo escolhido em Portugal era semelhante ao do palanque, de onde, sustentam alguns membros da entidade, a vitória parecia ser de Julian.
Parece óbvio que, em casos difíceis como os de Julian x Medina e Owen x Mineiro, os juízes devem pedir o auxílio de todos os ângulos possíveis para finalizar o julgamento. Boa dica. Outra medida importante seria dar transparência aos atos de head judge. Os juízes não podem ser os únicos a ficar na reta das críticas.
De toda a repercussão do caso, me chamou especialmente a atenção a popularidade atingida pela polêmica. A coluna escrita na semana passada bateu mais de 1,1 mil likes no Facebook, assim como outros textos explodiram a audiência de vários sites.
A despeito da campanha pelo boicote brasileiro a eventos, que andou circulando pelos fóruns de sites de surf, o erro de julgamento pinta como uma salvação para os bolsos da ASP. Agora, temos o drama, com bandidos, mocinhos e muita polêmica.
Não me espantarei se me disserem que o número de acessos da próxima etapa do WCT, em Santa Cruz, nos EUA, foi multiplicado em relação a Portugal.
O sistema tem a fórmula mágica para transformar limões em limonada. Transformou o movimento punk, que o contestava de modo visceral, em moda. E, absurdo ou não, o mesmo parece que irá acontecer agora: de um erro grosseiro, sairá o maior pico de audiência no ano e o provável início de uma rivalidade histórica e campeã de audiência.

Nenhum comentário:

Postar um comentário