Nota sobre o equilíbrio.
Equilíbrio e conexões, Reflexões de um jornalista inquieto.
Por Tulio Brandão
Um amigo cético perguntou, esses
dias de Rio+20, como eu via o tal do desenvolvimento sustentável. Veio à cabeça
a clássica noção, que fala em atender as necessidades presentes sem comprometer
a sobrevivência das gerações futuras.
Mas, como muitos, ando cansado de
definições concebidas em academias e palácios distantes do mundo real,
sobretudo diante dos resultados pífios da maior conferência de meio ambiente da
história da ONU.
Resolvi reduzir o conceito a
apenas duas palavras: equilíbrio e conexões.
Meu amigo pirou, disse
que eu andava com muito surf na cabeça. Equilíbrio? Conexões?
Então, expliquei meu raciocínio
torto, de canhoto: o modelo de capitalismo criado na Revolução Industrial
entende a economia como um organismo isolado, à parte de tudo, capaz de crescer
e se desenvolver como um corpo independente, que não toma conhecimento de nada
à sua volta. É estranhamente autossuficiente.
Nesta lógica, se o plano de
negócios assim indicar e a lei se omitir, o empreendedor instala a fábrica
dentro uma unidade de conservação ou ao lado da comunidade, usa a energia de
uma velha termoelétrica a carvão, descarta seus resíduos sem tratamento no rio
mais próximo, transporta a carga numa frota gasta de caminhões a diesel e, no
fim do processo, ignora o destino das embalagens que ele mesmo gera para
acondicionar seus produtos.
Do início ao fim, o negócio do
empreendedor está isolado, apenas com as conexões estritamente necessárias ao
lucro. É o negócio clássico, sem qualquer equilíbrio, capenga por não
considerar como elemento fundamental tudo o que está à nossa volta.
Pois não há organismo no mundo –
seja um homem, uma empresa ou uma árvore – capaz de ignorar o que se passa ao
redor impunemente. Sem conexões e equilíbrio, o organismo morre ou vira um
câncer e mata os outros. As duas consequências são desastrosas.
Em outras palavras, o capitalismo
não pode nos matar. Mas também não pode morrer, até porque até hoje não
encontraram um modelo alternativo eficiente na prática. Quem tiver dúvida, que
pergunte a um chinês trabalhador. A teoria do comunismo é fascinante, mas infelizmente
não inventaram um modelo democrático em que prevaleça o peso do Estado.
O negócio é tão complexo que nem
o tão celebrado capitalismo social europeu se mostrou viável em alguns países.
Agora, precisa, para sobreviver, de choques de austeridade.
O novo modelo de capitalismo
exige conexões. No longo prazo, vencerá aquele que conseguir se conectar mais
rapidamente. Aqui, lembro-me de Avatar, um filme óbvio, que vende a
sustentabilidade na embalagem comercial do manual de Syd Field, mas nos traz a
grande sacada da conexão materializada numa espécie de cordão umbilical com a
natureza.
Noves fora o simbolismo
exagerado, para sobreviver, o mercado precisa de conexões com o ambiente, com a
comunidade, com os resíduos gerados, com tudo o que nos cerca.
O novo plano de negócios prevê a
fábrica em áreas que causem menos impacto ao ambiente local, matrizes
energéticas renováveis, o reaproveitamento de seus resíduos dentro do processo
produtivo, emissão regulada de poluentes ou de CO2, um transporte limpo e a
responsabilidade pós-consumo nas mãos de todos nós.
Do lado de cá, dos cidadãos,
sabemos bem o que fazer: deixar de comprar como idiotas impulsivos e optar pela
compra equilibrada, sem excessos. O governo também conhece o seu papel de
regulador, mediador, fiscalizador. Pode começar fazendo o básico: aplicar leis.
É matemática: ou todo esse pacote
entra na conta, ou nós saímos da conta.
Com equilíbrio e conexões
sistêmicas, podemos enfim dispensar os colchetes sempre vazios de negociadores
dos governos, o green washing oco de parte da indústria e até mesmo alguns
discursos mais agressivos da ala verde radical.
Afinal, neste jogo, não é um
contra o outro. Estamos todos no mesmo barco. Navegamos juntos ou afundaremos
juntos.
Tulio Brandão é jornalista, autor do blog Surfe Deluxe. Trabalhou nove
anos no Globo como setorista de meio ambiente e outros três anos no Jornal do
Brasil, onde cobriu surf e outros esportes de prancha. Atuou ainda como gerente
de Sustentabilidade da Approach Comunicação. Na redação, ganhou dois prêmios
Esso, um Grande Prêmio CNT e um Prêmio Abrelpe.
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